Entusiasmado com a primeira experiência, vendo a mulher liberta, sentada bem ali na minha frente, estufei o peito tal qual um galo garnisé, bati no púlpito e disse:
“Aqui agora é assim, irmãos. O demônio que se atrever a manifestar-se vai ter de sair. Esta igreja a partir de hoje tem pastor. Se alguém tem em casa algum parente possesso, oprimido pelo diabo, pode me chamar que vou lá orar; ou, se preferir, traga-o aqui”.
Redobrei os esforços e distribui muitos convites para o culto dos jovens, no sábado seguinte.
Preparamos
umas lembrancinhas para dar aos visitantes, e uma boa salada de frutas para
saborearmos juntos ao final.
Enquanto me
dirigia para a reunião, meu coração recebeu uma nova porção de fé. Quando ia
entrando no templo uma garotinha me abordou.
- O senhor é o
pastor?
- Sou,
respondi. (Ainda não era pastor, mas senti bem em ser tratado como tal).
- Então o
Senhor podia ir lá em casa. O problema é o meu padastro. Ele está quebrando
tudo.
Chamei minha
esposa e disse:
- Volto já.
E segui a
garota. A casa ficava quase em frente à igreja.
Entrei e
deparei-me com a seguinte cena: móveis virados, vários objetos quebrados e um
homem forte estirado no chão, sem camisa, rosnando e babando, todo suado, e com
uma Bíblia no peito. A maior confusão.
Eu já tinha
visto demônio comer rosa com espinho e tudo, mas babar e roncar, essa era
novidade para mim.
- Qual o
problema? Indaguei: o que está acontecendo com o senhor? Porque está babando?
- Não te
interessa, respondeu.
Furioso, de um
salto pôs-se de pé e começou a dar gargaladas e a rasgar e a comer a Bíblia.
Foi que percebi o quanto ele era maior e mais forte que eu. Fiquei mudo.
A garota
conseguiu pegar a Bíblia. Então ele me agarrou pelo colarinho e prensou-me
contra a parede, rindo de mim.
“Meu Deus”,
pensei. “O que eu vim fazer aqui? Teria sido melhor eu ter ficado quietinho
apenas esquentando banco. Pra que fui aceitar essa de pastor?”
- Me largue,
falei quase sem ar.
- Cuidade,
pastor, ele é lutador de boxe, gritou a garota.
O seu grito
ficou gravado em minha memória. Isso já faz quase vinte anos, mas em qualquer
lugar do mundo que eu ouvir outra vez o seu grito, eu o conheço.
- Por que você
não me avisou?
Imaginem só.
Na época eu pesava uns cinqüenta e cinco quilos; aproximadamente vinte e cinco
a menos do que peso agora.
- O que você
veio fazer aqui, rosnou, esfregando-me na parede, agarrado à minha gravata,
quase me enforcando.
- Vim porque
me chamaram. Eu nem deveria estar aqui, respondi enquanto tentava escapar dali.
(embora
inconsciente, tudo isso estava-me acontecendo porque Deus desejava coisas novas
em minha vida.)
Ele me ergueu,
e de punho cerrado afastou o braço num gesto de quem ia me desferir um golpe.
“Senhor”,
clamei. “Eu nunca levei um soco de ninguém.
E o primeiro vai ser logo de um boxeador? Eu vou morrer com um soco? Meu
Deus, livra-me desse homem”.
Naquele
momento imaginei meu nariz indo parar lá na nuca.
- Eu vou te
matar, gritou. Vou te matar.
- Pastor, ele
vai matar o senhor, disse a garota.
“Jesus, tem
misericórdia de mim. Ta repreendido demônio”.
Dei um pulo
para o canto da sala e ele prostrou-se à porta de saída. Eu não tinha para onde
fugir. A garota, apavorada, saiu correndo e me deixou ali sozinho com ele.
Ele me agarrou
outra vez, me fustigando, me prensando na parede.
Ajuntando o
pouco de força que me restava, ordenei:
“Sai dele em
nome de Jesus”.
Em instantes,
aquele homem foi desmoronando diante de mim, deslizando por minhas costelas
reco-reco, arfando com um bafo terrível de cachaça, até cair com a cabeça entre
minhas pernas.
Afastei-me
dele e fui procurar a garota, que já voltava com alguém para me auxiliar.
- Onde está
ele, perguntaram.
- Está lá na
sala, respondi. Mas chamem a polícia, que o homem está caído no chão.
Voltei, e para
surpresa minha ele estava sentado no sofá. (Aliás, o único objeto ali que
resistira ao quebra-quebra.)
- O que
aconteceu aqui? Perguntou. O que aconteceu comigo?
- Você quebrou
tudo. Desmontou sua casa. Você estava possesso.
- Não pode. Eu
não vi nada.
- Mas foi você
mesmo. Ou melhor o demônio que estava em você.
- Foi o senhor
que orou por mim?
- É, foi.
Então ele, me
abraçando, falou:
- Me ajuda,
pastor. Eu preciso muito de ajuda.
Fiquei ali
pasmo, morrendo de medo dele. Mas mesmo relutante o abracei.
-Saiu alguma
coisa estranha de mim. Me sinto livre, disse. E de onde veio o senhor?
- Sou pastor
da igreja que fica logo ali.
- Então vou
lá.
- Mas nossa
igreja só tem bancos vazios, tentei tirá-lo de cabeça. Contudo foi em vão.
Voltei para a
igreja, e ele me seguiu. Dirigi o culto de olhos pregados nele. Não os fechei
nem para orar. Quando fiz o apelo, ele foi à frente e rendeu sua vida a Cristo.
Parou de beber e fumar. E a partir daí estava sempre mas reuniões. Dois meses
depois o batizei (sem gravata!).
Todo aquele
medo que experimentei diante desse homem possesso era evidência da vida
medíocre que eu vinha levando, fruto de uma visão tacanha de Jesus. Cria no
poder da oração do meu partor mas não cria no poder da minha oração. Via o
poder de Deus na vida dele, mas não o via em mim. Foi necessário que Deus me
pusesse frente a frente com aqueles dois desafios para me abrir os olhos.
Quando parei
para pensar naquelas duas primeiras conversões – a mulher das rosas e o
boxeador – foi quando compreendi que Jesus não cabe na compreensão de nossa
mente, que nossa cabeça é muito pequena para comportá-lo. Nós é que precisamos
nos elevar ao plano em que Cristo está, para assimilar a grandeza e o poder que
há no seu nome. Naqueles dias compreendi que o meu Deus não era apenas o Deus
de Abraão, Isaque e Jacó, e de Pedro; ele era também o meu Deus, o meu Senhor.
O Jesus que me dava autoridade sobre os demônios não atuava só através do meu
pastor, mas desejava manifestar seu poder através de minha vida. Aleluia!
Hoje, graças a
Deus, quando me deparo com casos de possessão demoníaca, meus joelhos não
tremem mais. Quem treme é o diabo.
Da mesma forma
que Deus libertou aquele homem e aquela mulher usando a mim, ele deseja usar
você. Ele deseja tornar cada um de nós instrumentos de libertação. Antes,
porém, necessitamos que ele mude nossa mentalidade e nos abra os olhos para que
o vejamos como ele é.
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